Aquecimento solar - Lei de São Paulo para construção divide advogados


Aquecimento solar - Lei de São Paulo para construção divide advogados


Gláucia Milicio

Mal foi regulamentada pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, a Lei 14.459/07 já causa controvérsias. A regra é que todas as novas construções, residenciais ou não, instalem sistema de aquecimento solar. Para alguns especialistas do Direito Imobiliário, além de elevar o custo na construção civil, a norma fere o direito à livre iniciativa.

Nos imóveis com até três banheiros, a lei determina que seja preparada a infra-estrutura para a futura instalação do sistema. Nos imóveis com quatro banheiros ou mais, o sistema de aquecimento solar deverá ser obrigatoriamente instalado.

A lei determina, ainda, que todos os imóveis novos ou antigos com piscina aquecida utilizem o sistema solar. As normas serão aplicadas aos projetos de novas edificações protocolados a partir de 180 dias da data da regulamentação da lei. A lei foi publicada no Diário Oficial, na terça-feira, 22 de janeiro.

Livre iniciativa em jogo

Para o advogado Luiz Gustavo de Oliveira Ramos, sócio do escritório Rayes, Fagundes e Oliveira Ramos Advogados, os custos serão sentidos no bolso do consumidor. O advogado faz questão de ressaltar que não questiona a competência do prefeito Kassab em regulamentar uma norma como está. O que falta, segundo ele, é clareza técnica sobre as novas obrigações. Para Oliveira Ramos, a norma restringe o poder de escolha do consumidor final.

O advogado Rodrigo Badaró de Castro, especialista em Direito Imobiliário, sócio do escritório Azevedo Sette Advogados, diz que “o direito da livre iniciativa é tão constitucional quanto a preservação do meio ambiente”.

Ele destaca que a obrigatoriedade em usar a energia solar leva a entender, ainda que não seja a intenção, que outra forma de energia utilizada é ilícita. De acordo com o advogado, a imposição da norma fere o direito de liberdade e livre atividade.

“Esse tipo medida é louvável se for pensar na questão ambiental, mas é um abuso exigir um uso específico de energia. Seria interessante promover uma campanha de conscientização com estímulos públicos e nunca a obrigatoriedade”, avalia. Questionado sobre a constitucionalidade da nova lei, o advogado afirmou que ela pode ser contestada em Ação Direita de Inconstitucionalidade no Tribunal de Justiça de São Paulo.

Interesse local

O advogado Luis Eduardo Serra Netto, especialista em Direito Administrativo do Duarte Garcia, Caselli Guimarães e Terra Advogados, discorda dos colegas. Segundo ele, o que deve ser analisado na questão é o ponto de vista jurídico e não o impacto financeiro.

“Reduzir o uso de energia convencional com adoção de um sistema de energia solar, que é gratuita, não significa aumentar o custo. Existem pessoas que pagam para ter aquecimento no banheiro. Então, por que não pagar por um tipo de energia como essa?” questiona. Do ponto de vista jurídico, ele diz que o município tem competência legislativa para disciplinar tudo que for de interesse local e que não vê inconstitucionalidade na lei. “Há certa razoabilidade na norma”, declarou.

O advogado André Hermanny Tostes, especialista em Direito Ambiental e Direito Administrativo, também é a favor da nova regra. De acordo com ele, medidas dessa natureza são sempre bem vindas. Ele explica que a lei reflete as preocupações gerais com fontes energéticas baratas, renováveis e não agressivas.

“É dever dos municípios assegurar meio ambiente ecologicamente equilibrado (artigo 225 da Constituição Federal), como é também da competência das municipalidades dispor sobre assuntos de interesse local. Dentre eles, as exigências relativas às construções realizadas em seu território (urbanas e rurais), conforme previsão do artigo 30, I da Constituição Federal”, conclui.

Leia o decreto da lei

Decreto Municipal 49.148, De 21.01.2008: Regulamenta a Lei 14.459, de 03 de julho de 2007, que acrescenta o item 9.3.5 à Seção 9.3 — Instalações Prediais do Anexo I da Lei 11.228, de 25 de junho de 1992 (Código de Obras e Edificações), e dispõe sobre a instalação de sistema de aquecimento de água por energia solar nas novas edificações do município de São Paulo.

GILBERTO KASSAB, prefeito do município de São Paulo, no uso das atribuições que lhe são conferidas por lei,

CONSIDERANDO as conclusões alcançadas pelo Grupo de Trabalho constituído pela Portaria 1.050 — PREF, de 10 de outubro de 2007,

D E C R E T A:

Art. 1º. Este decreto regulamenta a Lei nº. 14.459, de 3 de julho de 2007, que acrescenta o item 9.3.5 à Seção 9.3 – Instalações Prediais do Anexo I da Lei nº. 11.228, de 25 de junho de 1992 (Código de Obras e Edificações), e dispõe sobre a instalação de sistema de aquecimento de água por energia solar nas novas edificações do Município de São Paulo.

§ 1º. A instalação a que se refere o “caput” deste artigo deverá ser projetada e executada conforme as Normas Técnicas Oficiais vigentes, que estabelecem os requisitos para o Sistema de Aquecimento Solar – SAS, considerando os aspectos de concepção,

dimensionamento, arranjo hidráulico, especificação de componentes, instalação e manutenção, onde o fluido de transporte é a água.

§ 2º. O SAS é composto por coletor solar, reservatório térmico, aquecimento auxiliar, acessórios e suas interligações hidráulicas que funcionam por circulação natural ou forçada.

Art. 2º. É obrigatória a instalação do SAS nas novas edificações do Município de São Paulo destinadas às categorias de uso residencial e não-residencial.

Art. 3º. A obrigatoriedade estabelecida no artigo 2º deste decreto aplica-se, na categoria de uso não-residencial, às seguintes atividades de comércio, de prestação de serviços públicos

e privados, e industriais:

I – hotéis, motéis e similares;

II – clubes esportivos, casas de banho e sauna, academias de ginástica e lutas marciais, escolas de esportes e estabelecimentos de locação de quadras esportivas;

III – clínicas de estética, institutos de beleza, cabeleireiros e similares;

IV – hospitais, unidades de saúde com leitos e casas de repouso;

V – escolas, creches, abrigos, asilos e albergues;

VI – quartéis;

VII – indústrias, se a atividade setorial específica demandar água aquecida no processo de industrialização ou, ainda, quando disponibilizar vestiários para seus funcionários;

VIII – lavanderias industriais, de prestação de serviço ou coletivas, em edificações de qualquer uso, que utilizem em seu processo água aquecida.

Art. 4º. Sem prejuízo do estabelecido no artigo 2º deste decreto, é igualmente obrigatória a instalação do SAS nas edificações, novas ou não, isoladas ou agrupadas horizontal ou verticalmente ou superpostas, da categoria de uso residencial, ou integrantes de conjunto de instalações de usos não-residenciais, que incluam a construção de piscina de água aquecida.

§ 1º. Para os fins deste decreto, consideram-se piscinas todos os reservatórios de água para finalidades de lazer, terapêuticas e de práticas esportivas, com capacidade superior a 5m3 (cinco metros cúbicos).

§ 2º. O SAS específico para a piscina é composto por coletor solar, aquecimento auxiliar, acessório e suas interligações hidráulicas que funcionem por circulação natural ou forçada.

§ 3º. O disposto neste artigo aplica-se somente às piscinas, novas ou existentes, que venham a receber um sistema de aquecimento.

Art. 5º. Nas novas edificações destinadas ao uso residencial, uni familiar ou multifamiliar, que tenham um número de banheiros igual ou superior a 4 (quatro) por unidade habitacional deverá ser instalado o sistema de aquecimento solar completo.

Parágrafo único. Para efeito de aplicação deste decreto, define-se:

I – banheiro, o aposento dotado de vaso sanitário, possuindo ou não, em suas instalações, aquecimento de água sanitária por alguma fonte de energia;

II – água sanitária, a água potável utilizada para consumo humano;

III – água de piscina, a água tratada para uso exclusivo de abastecimento da piscina.

Art. 6º. Nas novas edificações destinadas ao uso residencial uni familiar ou multifamiliar, que possuam até 3 (três) banheiros por unidade habitacional, deverá ser executada toda a infra-estrutura (sistema de instalação hidráulica, prumadas, respectiva rede de distribuição e suporte estrutural adequado) que permita a instalação do reservatório térmico e das placas coletoras de energia solar.

Parágrafo único. O disposto no “caput” deste artigo não se aplica à hipótese em que o uso do SAS for tecnicamente inviável, nos termos do artigo 12 deste decreto.

Art. 7º. As instalações hidráulicas e os equipamentos de aquecimento de água por energia solar deverão ser dimensionados para atender, no mínimo, a 40% (quarenta por cento) de toda a demanda anual de energia necessária para o aquecimento de água sanitária e água de piscinas, de acordo com a Metodologia de Avaliação da Contribuição Solar constante do Anexo

Único deste decreto, atendendo às Normas Técnicas Oficiais.

§ 1º. Para efeito de comprovação das exigências da Lei n° 14.459, de 2007, e deste decreto, os equipamentos solares devem apresentar obrigatoriamente a etiqueta do Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro), de acordo com os regulamentos específicos aplicáveis do Programa Brasileiro de Etiquetagem — PBE.

§ 2º. A Prefeitura do Município de São Paulo poderá exigir o cumprimento de outras normas técnicas ou recomendações normativas de projeto e instalação de sistemas relacionados com o SAS.

Art. 8º. O somatório das áreas de projeção dos equipamentos, constituídos pelas placas coletoras e reservatórios térmicos, não será computável para efeito do cálculo do coeficiente de aproveitamento básico e máximo previsto na Legislação de

Parcelamento, Uso e Ocupação do Solo – LPUOS.

Parágrafo único. A área de projeção mencionada no “caput” deste artigo refere-se ao resultado da aplicação dos parâmetros contidos no Anexo Único deste decreto.

Art. 9º. Para a obtenção de Alvará de Aprovação e/ou Execução, deverá constar, nas peças gráficas, nota técnica declarando o atendimento à Lei nº. 14.459, de 2007, e a este decreto,

bem como indicação da implantação e dimensões dos equipamentos a serem instalados (altura para efeito de gabarito, largura e inclinação).

Art. 10. Na relação de documentos exigidos para a obtenção de licenças perante a Prefeitura, que não necessitem da entrega de peças gráficas, deverá constar declaração por parte do engenheiro responsável pela obra atestando o atendimento das disposições previstas na Lei nº. 14.459, de 2007, e neste decreto.

Art. 11. Em qualquer das hipóteses a que se referem os artigos 9º e 10, deverá, ainda, ser apresentada, pelo responsável técnico da obra, a respectiva Anotação de Responsabilidade Técnica – ART do Sistema de Aquecimento Solar projetado e/ou instalado.

Art. 12. A obrigatoriedade da instalação de Sistema de Aquecimento Solar não se aplica a edificações onde se comprove ser tecnicamente inviável alcançar as condições para aquecimento de água por energia solar.

§ 1º. O enquadramento na situação prevista no “caput” deste artigo deverá ser comprovado mediante Parecer Técnico, acompanhado de estudos técnicos conclusivos elaborados por

profissional habilitado, demonstrando a inviabilidade de atendimento à exigência legal, consoante os parâmetros estabelecidos no Anexo Único integrante deste decreto.

§ 2º. A documentação prevista no § 1º deste artigo deverá ser apresentada à Prefeitura no momento da solicitação das licenças, devendo ser juntada ao processo administrativo pertinente.

§ 3º. Os estudos técnicos deverão considerar o emprego da melhor tecnologia disponível, nos termos das recomendações técnicas do Inmetro e das normas técnicas vigentes, e deverão apresentar parecer definitivo, com conclusões objetivas, bem como identificar claramente a obra a que se referem.

§ 4º. Quando dos pedidos de licenças, o responsável técnico deverá apresentar declaração quanto à inviabilidade de implantação do SAS, acompanhada do recolhimento de ART específica para o referido estudo de inviabilidade.

§ 5º. Para efeitos deste decreto, consideram-se critérios técnicos que tornem inviável a implantação do SAS os fatores que reduzam a fração solar a valores inferiores aos exigidos para contribuição solar, na conformidade do disposto no artigo 7º deste decreto, decorrentes de:

I – sombreamento do local de implantação dos coletores solares por edificações e/ou obstáculos externos existentes que não fazem parte da edificação;

II sombreamento sobre a área coletora, obtido por meio do método de carta solar, avaliado no dia 6 (seis) de abril nos horários de 9h (nove horas), 12h (doze horas) e 15h (quinze horas), nas seguintes condições:

a) se for maior do que 60% (sessenta por cento), em pelo menos um desses horários, não será possível a utilização do SAS;

b) se estiver entre 30% (trinta por cento) e 60% (sessenta por cento), em pelo menos um desses horários, o SAS deve ser instalado, mas com ajuste das baterias de coletores e acionamento independente do sistema de circulação de água;

c) se estiver abaixo de 30% (trinta por cento), em pelo menos um desses horários, o SAS deve ser instalado;

III – limitações derivadas da aplicação da Legislação de Uso e Ocupação do Solo e do Código de Obras e Edificações, que evidenciem a impossibilidade de dispor de toda a superfície de coletores solares necessária ao atendimento das disposições da

Lei 14.459, de 2007, e deste decreto.

Art. 13. Decreto específico, a ser editado no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, definirá, para as novas edificações destinadas às Habitações de Interesse Social – HIS, as normas de

implantação, os procedimentos pertinentes e os prazos para atendimento às disposições da Lei n° 14.459, de 2007.

Art. 14. Aplicam-se as disposições da Lei nº. 14.459, de 2007, e deste decreto aos projetos de novas edificações protocolizados a partir de 180 (cento e oitenta) dias da data de publicação deste decreto.

Art. 15. Este decreto entrará em vigor na data de sua publicação.

PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 21 de janeiro de 2008, 454º da fundação de São Paulo.

GILBERTO KASSAB, PREFEITO

Publicado na Secretaria do Governo Municipal, em 21 de janeiro de 2008.

CLOVIS DE BARROS CARVALHO, Secretário do Governo Municipal

Revista Consultor Jurídico, 26 de janeiro de 2008