Debate de Cade e BC sobre fusões voltará à pauta do STJ


Debate de Cade e BC sobre fusões voltará à pauta do STJ


Suspensa no último dia 27, a queda-de-braço entre os órgãos deve voltar antes do recesso forense, que é de 20 de dezembro a 6 de janeiro de 2010, à pauta do STJ

São Paulo

A esperada discussão acerca da competência do Banco Central ou o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) sobre a análise quanto às compras e fusões de bancos – tendo em vista a concentração econômica setorial –, adiada na semana passada, voltará à pauta ainda em 2009. Quem garante é o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Cesar Asfor Rocha.

“Deve voltar brevemente, mas não posso dizer com precisão a data porque está com pedido de vistas para o ministro Castro Meira. Mas volta ainda neste ano”, assegurou o ministro Rocha.

A relatora do caso é a ministra Eliana Calmon, e o julgamento foi interrompido em 27 de outubro pelo pedido de vista de Meira.

Já há voto da relatora atribuindo a competência ao Bacen. “Ainda que prevaleça esse voto, seria interessante uma especificação de quais seriam as atividades tipicamente financeiras sujeitas ao controle do Bacen, separando-as das atividades não propriamente financeiras, sujeitas ao Cade”, alerta Juliano Maranhão, sócio do escritório Sampaio Ferraz Advogados e responsáveis no Cade pelo processo de fusão entre Itaú Unibanco, bem como pelas aquisições dos Bancos Estaduais e do banco Votorantim pelo Banco do Brasil. Para ele, essa indeterminação pode gerar novos conflitos institucionais. “Caso defina-se pela competência do Cade para aspectos financeiros, também restará a definição dos poderes para instrução, o que também pode suscitar controvérsias”, pondera Maranhão.

Para o advogado José DelChiaro, sócio fundador do Instituto Brasileiro de Estudos de Concorrência, Consumo e Comércio Internacional (Ibrac), a questão é complexa e poderia ser resolvida longe dos tribunais, “mediante diálogo entre instituições e não através de uma decisão proferida em juízo”. DelChiaro, que foi o primeiro Secretário de Direito Econômico do Ministério da Justiça (1990), destaca que o diálogo é importante para que uma alternativa negociada e bem estruturada seja alcançada.

Evitar a discussão, no entanto, parece difícil, principalmente porque o Cade vem conquistando, gradativamente, o respeito das grandes empresas no que se refere a ocupar a vaga de autoridade que dá o aval ou não a atos de concentração. “Não há uma disputa entre o Cade e o Banco Central até mesmo porque Cade e Bacen assinaram, no final do ano passado, um documento que está no site do Cade em que cada qual reconhece a competência do outro”, disse Arthur Badin, presidente do Cade, em evento na capital paulista na última semana.

Segundo o presidente do órgão antitruste, o Cade reconhece a competência do Bacen para tomar as decisões relativas a regulação do sistema financeiro, inclusive com o poder de aprovar uma operação em que se identifique riscos sistêmicos. Mas Badin faz questão de frisar que cabe ao Cade a grande maioria dos atos no setor concorrencial.

“Agora, aqueles outros 99% dos casos em que não há risco sistêmico e, portanto, a defesa da concorrência deve ser analisada como todos os outros mercados – regulados ou não – como o do frango, de telefone, energia, petróleo e por aí vai”, disse Arthur Badin, enfatizando a possibilidade de que, se o STJ decidir em favor do Bacen, isso pode gerar conflito nos demais setores da economia brasileira.

“Todos nós brasileiros temos de cumprir todas as leis, agora esse setor especificamente só cumpre as leis do Banco Central e não precisa cumprir as demais”, alfineta Badin.

Análise advocatícia

Especialistas em direito concorrencial ouvidos pela reportagem dividem opiniões sobre quem deve ficar com essa função. O advogado Ricardo Inglêz de Souza, do Demarest e Almeida, vota para que o Cade assuma, oficialmente, essa função. “O mais adequado seria que o Cade julgasse os atos de concentração envolvendo bancos, ainda que o Bacen fosse o responsável pela análise inicial do caso. Basicamente, as razões seriam porque o Bacen jamais exerceu o controle da estrutura deste mercado; não há nenhum outro setor isento do controle do Cade; e, por fim, o famoso “risco sistêmico” é um falso dilema”, afirmou Souza.

Marcel Medon Santos, do Azevedo Sette Advogados, discorda, e defende que caberiam ao Cade as aprovações de operação quando não haja risco sistêmico e ao Bacen, as que apresentem esse tipo de risco.

Caso o Banco Central seja o “escolhido” no STJ, o Cade pode tentar reverter esta questão no legislativo (onde tramitam dois projetos de lei complementar sobre a matéria). “Se o Cade for considerado competente, os bancos podem ter um passivo de operações não apresentadas que será um problema a ser administrado. Porém, no geral e no médio/longo prazo, seria melhor ter o Cade como ponto de equilíbrio para evitarmos a ‘tutela’ do órgão regulador sobre seus regulados”, opinou Inglêz de Souza.