Descontos incondicionais não podem integrar o valor da operação de venda


Descontos incondicionais não podem integrar o valor da operação de venda


A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) autorizou a dedução dos descontos incondicionais da base de cálculo do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Ao julgar pela primeira vez o tema, a segunda turma reforçou o entendimento do STJ favorável ao contribuinte. O desconto incondicional é aquele oferecido pelas empresas, na venda de produtos, que independe de qualquer contrapartida.

O relator do recurso, ministro João de Otávio Noronha, manifestou-se no sentido de que os descontos incondicionais não podem integrar o valor da operação de venda para fins de tributação do IPI. O relator justificou a decisão afirmando que esses descontos compõem quantia deduzida do montante da operação antes de realizada a saída da mercadoria.

“Nesse caso, não há a existência do fato gerador de imposto”, diz Eduardo Perez Salusse do escritório Neumann, Salusse, Marangoni Advogados. Ele afirma que tanto a base de cálculo quanto a alíquota constituem a expressão econômica da operação, da qual decorre a incidência do imposto. “Se você concede um desconto no ato da venda não há como considerar o referido desconto como parte integrante do valor da operação”, completa.

O advogado Robertson Emerenciano concorda com a inexigibililidade do IPI sobre os descontos incondicionais. “A Lei nº 7.798/89 tenta tributar sobre a base de cálculo total sem considerar o valor real da operação”, afirma.

Para Luis Augusto da Silva Gomes, do Marcondes Advogados Associados, a exigência do IPI na saída de mercadorias com descontos incondicionais, determinada pelo artigo 15 da Lei nº 7.798 que deu nova redação ao artigo 14 da Lei 4.502/64, é ilegal. Segundo o tributarista, deve prevalecer o princípio da hierarquia das normas, onde a Lei 7.798 não poderia alterar a base de cálculo prevista no artigo 47 do Código Tributário Nacional.

“Trata-se de dirimir um caso clássico de conflitos de leis”, concorda o tributarista Fábio Tadeu Ramos, do Azevedo Sette Advogados. Para ele também deve-se aplicar a hierarquia de normas existente no nosso sistema jurídico, segundo a qual a lei menor (a lei ordinária, neste caso) não pode contrariar, ampliar ou modificar o conteúdo da lei tida como maior (no caso, o CTN).

Salusse afirma que o artigo 15 da Lei 7.798 ainda fere o princípio constitucional da capacidade contributiva, uma vez que o Estado só pode receber a título de tributação, valores que refletiram atos de comércio.
Com a pacificação do entendimento no STJ, diz Luis Augusto Gomes, fica assegurada a dedução dos descontos incondicionais em relação às operações futuras feitas pelo contribuinte.

Já a recuperação dos valores pagos indevidamente nos últimos cinco anos deve obedecer ao disposto no artigo 166 do CTN. Gomes explica que por se tratar de imposto indireto, o contribuinte deve comprovar que assumiu o encargo financeiro do tributo ou então obter uma autorização do seu cliente para poder realizar a restituição dos valores, conforme entendimento do STJ e também do Supremo Tribunal Federal (STF).

Salusse acrescenta que há uma decisão do STF que autorizou a restituição de tributo indireto pelo contribuinte de direito. É um caso raro no qual o contribuinte conseguiu provar que assumiu o encargo financeiro do tributo indireto, nos termos do Código Tributário.

Mas na prática, diz o advogado Silva Gomes, no caso do IPI sobre descontos incondicionais, são emitidas duas notas fiscais, uma com o valor da venda tributável pelo imposto, e outra nota com o valor do desconto incondicional. “O valor dessa última nota não é repassado ao consumidor, sendo então demonstrado o encargo financeiro arcado pelo contribuinte”, diz. Segundo Gomes, neste caso é possível a restituição dos valores, corrigidos pela Selic.

Valor Econômico em 29/08/2005