Mineradoras discutem autuações milionárias


Mineradoras discutem autuações milionárias


Alessandro Cristo

O advogado Fernando Scaff, que representa mineradoras, afirma que as autuações às empresas representam uma clara intenção do departamento em aumentar a arrecadação a qualquer custoApós sofrerem uma derrota na briga judicial com os municípios, que garantiram um aumento no recebimento de royalties no Superior Tribunal de Justiça (STJ) em junho, uma nova disputa atinge as mineradoras. O Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), que controla a arrecadação da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM), tem autuando as empresas sob o entendimento de que as mineradoras estariam realizando deduções indevidas na base de cálculo da contribuição. As mineradoras alegam que a legislação autoriza tais deduções, o que tem gerado diversos recursos administrativos propostos pelas empresas, alguns sob análise do Ministério de Minas e Energia. O que essas empresas fazem é descontar da base de cálculo da contribuição os tributos e os gastos com transporte e seguro. Advogados criticam o comportamento do departamento em razão das multas milionárias aplicadas – há casos de autuações que, segundo eles, chegam a R$ 11 milhões.

O valor da contribuição é calculada a partir da aplicação de uma alíquota sobre o faturamento líquido da comercialização efetuada pelas mineradoras. As alíquotas variam conforme o tipo de minério. Tributaristas afirmam que a legislação permite a dedução, da base de cálculo, de gastos com transporte e seguro dos minérios, por exemplo, e que desde março o departamento teria intensificado a fiscalização do recolhimento da CFEM, autuando as mineradoras com multas milionárias, em razão dos descontos realizados.

Segundo o advogado Fernando Facury Scaff, do escritório Silveira, Athias, Soriano de Mello, Guimarães, Pinheiro & Scaff Advogados, que representa algumas mineradoras, há situações em que o órgão considera indevidas todas as deduções, cobrando a CFEM sobre o faturamento total das empresas. É o caso de um de seus clientes no Pará, que sofreu uma autuação de R$ 11 milhões em outubro. “As planilhas do departamento apontavam, como procedimento correto, a aplicação de 0% de deduções de todos os tributos e gastos”, afirma. O advogado diz ter recorrido administrativamente no início deste mês e afirma que ainda aguarda a análise do departamento. “É uma clara intenção de aumentar a arrecadação a qualquer custo”, diz.

Para o advogado Leonardo Farias Alves de Moura, do escritório Azevedo Sette Advogados, o problema fica ainda mais complicado quando os tributos são recolhidos via compensação com impostos pagos a maior. Isto porque, segundo ele, o único documento aceito pelo DNPM para dedução por impostos pagos é a guia recolhida na rede bancária. Como as compensações de tributos federais são feitas via processos administrativos, os documentos relacionados não são aceitos como prova de pagamento. O advogado afirma que, por enquanto, as empresas têm buscado os recursos administrativos, mas não descarta uma possível onda de ações judiciais. Para ele, outras demandas estão relacionadas ao problema, como as disputas que tramitam no Judiciário sobre o prazo prescricional da CFEM, que depende da interpretação da contribuição como tributo ou como preço público. Segundo ele, tributos prescrevem em cinco anos e preços público, em até dez anos. Segundo o advogado, o Supremo Tribunal Federal (STF) já afirmou que a CFEM não é um tributo, mas não consolidou necessariamente ser um preço público, o que mantém a questão em aberto.

Já o advogado Alessandro Amadeu da Fonseca, do Mattos Filho Advogados, afirma que a CFEM não é nem mesmo é um preço público, pois não é uma contrapartida pela prestação de um serviço público, e sim uma compensação à União pela exploração de um recurso mineral exaurível. Para ele, a lei que disciplina o recolhimento da contribuição – a Lei nº 7.990, de 1989 — é inconstitucional, já que menciona como base de cálculo o faturamento líquido e não o resultado do exercício das mineradoras, como define o parágrafo 1º do artigo nº 20 da Constituição Federal.

O presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Paulo Camillo Penna, afirma que muitas autuações ocorridas neste ano mostraram problemas de ordem técnica e jurídica dentro do DNPM. Segundo ele, os fiscais do órgão visitaram filiais das mineradoras, onde a extração ocorre, e exigiram, como forma de comprovação das deduções, a apresentação das guias recolhidas dos impostos. “O departamento não observou regras básicas de contabilidade, e nem mesmo a legislação, que obriga que as guias de recolhimento permaneçam arquivadas nas matrizes”, diz. Em outros casos, de acordo com Penna, o departamento autuou empresas pelo não-recolhimento da contribuição sobre notas de simples remessa, utilizadas para acompanhar o transporte das cargas. Porém, as notas de venda, segundo Penna, seriam emitidas nos locais de embarque dos produtos, como os portos. Somente nesta ocasião, diz, haveria a incidência da contribuição. Desta forma, a contribuição estaria sendo cobrada em duplicidade. O presidente do Ibram afirma, no entanto, que já existe diálogo com a diretoria do departamento e representantes do Ministério de Minas e Energia. Procurada pelo Valor, a diretoria do DNPM não se pronunciou sobre o assunto.

Notícia publicada no Valor Econômico, 22 de novembro de 2007