Ministro quer vetar artistas em propaganda de cerveja


Ministro quer vetar artistas em propaganda de cerveja


Proposta, diz Temporão, deve ser incluída no pacote de novas regras da Anvisa

Ministro da Saúde diz que novas normas devem restringir horário e conteúdo da publicidade de bebidas alcoólicas.
O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, defendeu ontem a proibição da aparição de “pessoas famosas, artistas e atletas” na veiculação de propagandas e peças publicitárias de bebidas alcoólicas. A proposta deve ser incluída no pacote de novas regras que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) prepara para aprovar no fim deste mês.

A proposta do ministro foi feita durante audiência na Comissão de Assuntos Sociais do Senado, após ser indagado pelo senador Flávio Arns (PT-PR) sobre uma propaganda de cerveja na qual o sambista Zeca Pagodinho “elege” um dia da semana para que as pessoas consumam a bebida.
“Pelas pesquisas, é um dia da semana [quarta-feira] em que as pessoas bebem menos. E, por isso mesmo, fez-se a campanha para incentivar o consumo de bebida”, disse Arns.

O ministro, então, fez a defesa da nova proposta. “Quando o Zeca Pagodinho protagoniza uma propaganda de cerveja é uma coisa dramática. Gosto dele como artista, mas é preciso pedir para ele parar. É patético, constrangedor”, disse.

A proposta de vetar a aparição de “celebridades” nas propagandas não recebeu mais comentários dos senadores que, no entanto, elogiaram a atitude do ministro no episódio da quebra de patente do medicamento anti-Aids Efavirenz, na semana passada.

Temporão afirmou que são duas as linhas que pautam a regulamentação da publicidade de bebidas alcoólicas: “A primeira, que regula o horário de veiculação, e a segunda, que diz respeito ao conteúdo das propagandas. De que maneira colocam o produto no mercado? As estratégias publicitárias focadas em jovens e adolescentes são inadmissíveis”, afirmou.

“A proibição da aparição de pessoas famosas [artistas e atletas] em propagandas de bebidas alcoólicas vai ser proposta pela Anvisa, com certeza, é uma proposta nossa.”

O Ministério da Saúde foi questionado, por meio de sua assessoria de imprensa, qual seria o critério para definir quem seriam as pessoas proibidas de atuar nas propagandas e qual seria a punição caso uma dessas pessoas infringisse a proibição. Não houve resposta.

O Conar (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária) foi procurado, mas não quis se pronunciar sobre a declaração do ministro.

  • Para advogado, veto a famosos é irregular

Especialistas dizem que possível restrição a presença de artista em comercial de bebida alcoólica é inconstitucional.

“Fiz, mas não faria de novo campanha de cerveja”, diz o apresentador Luciano Huck, astro de propaganda da Nova Schin em 2003

Advogados ouvidos pela Folha são unânimes em apontar a inconstitucionalidade na eventual proibição de famosos em comerciais de bebida alcoólica.
Para o presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Cezar Britto, o veto seria uma restrição ao exercício profissional. “Uma das características do artista é vender sua própria imagem.”

Britto disse ainda que restringir a participação de famosos em peças publicitárias não reduz o poder de atração -dada a criatividade dos publicitários. Ele sugere limitar ou proibir esse tipo de exibição, como ocorreu com o tabaco.

O advogado especialista em direito civil e contratos Ricardo Sette disse que a intenção do governo é um “despropósito” e deve ser barrada pelo STF (Supremo Tribunal Federal), porque fere pelo menos três itens da Constituição, entre eles a liberdade de expressão. “Além disso, a cerveja é um produto legal no país”, disse.

Para o especialista em defesa de empresas de comunicação Lourival Santos, o ato é “discriminatório”. “Fere princípios fundamentais, como o livre exercício do trabalho lícito.”

“Bom senso”
Astro da campanha “Experimenta”, que lançou a cerveja Nova Schin em 2003, o apresentador Luciano Huck, da TV Globo, diz que “o artista, enquanto pessoa pública, tem de ter bom senso em relação às marcas e produtos que avaliza”.

“Fiz, mas não faria de novo campanha de cerveja”, afirma Huck. “Assim como jamais faria de produtos relacionados ao tabaco e às bebidas com maior teor alcoólico”.

Ele declara discordar da interferência do governo. “Quem tem de resolver a que produto irá se associar, que bandeira irá levantar, que causas irá apoiar, é o próprio [artista]. O governo não tem nada a ver com isso”, diz ele, que aparecia ao lado de Zeca Pagodinho, Thiago Lacerda e Fernanda Lima, entre outros artistas. Zeca Pagodinho, atual garoto-propaganda da Brahma, não foi encontrado.

Ex-garota-propaganda da Skol, a apresentadora Luize Altenhofen também diz que não quer mais anunciar cerveja. “Estou em outro momento. Meu foco agora é esporte”, diz ela, que trabalha em um programa esportivo da Band.

Luize não quis opinar sobre as críticas do ministro. “Isso você tem que ver com meu empresário. Explique as perguntas para ele que ele me repassa. Preciso ver com a assessoria da Band se falar sobre isso é bom para a minha imagem”, explica.

Primeira “namorada” do baixinho da cervejaria Kaiser (chegou a posar para revistas especializadas em celebridades “assumindo” o romance com o o ator José Valien), a atriz Karina Bacchi não quis falar nada.

As outras “namoradas” do personagem da Kaiser, Adriane Galisteu e Danielle Winits, também foram procuradas, mas não responderam até o fechamento desta edição.

Notícia publicada na Folha de S. Paulo, 10 de maio de 2007