Operações de investimento movimentam escritórios


Operações de investimento movimentam escritórios


O setor de direito societário de alguns escritórios de advocacia brasileiros, que possuem parceria ou a cooperação de escritórios internacionais, têm registrado a retomada da demanda por operações de captação de recursos no exterior chamadas de “cross border”. Cruzando fronteiras, por meio dessas operações, empresas nacionais de grande porte buscam uma fonte externa para fazer caixa, devido à escassez de oferta de crédito no país. Por serem operações mais sofisticadas do que um financiamento junto a banco privado ou mesmo uma fusão, a necessidade de um bom acompanhamento jurídico nas operações cross border, vem levando os escritórios a lucrar com honorários, que são calculados por horas trabalhadas.

As operações cross border são estruturas que geralmente envolvem uma empresa brasileira, um banco brasileiro – que é intermediador da operação – e um investidor estrangeiro, que pode ser um banco, fundo ou clube de investimento. Empresas brasileiras do ramos imobiliário, frigorífico, telecomunicação, varejo, petróleo e álcool já estão buscando essas operações. Com escritórios de apoio na América do Norte, Europa, Ásia e América do Sul, a banco Azevedo Sette Advogados, por exemplo, coordena uma operação que envolve financiamento, parte de securitização e parte em emissão de ações, que totaliza US$ 200 milhões. O escritório Lefosse Advogados, que trabalha em cooperação com o escritório Linklaters, hoje, coordena cinco operações de securitização em andamento. Já a banca Pinheiro Neto Advogados, que é parceira do Shearman & Sterling, é responsável por cinco Fundos de Investimento em Participações (FIP) cujo total estimado supera US$ 600 milhões e Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC), que somam cerca de US$ 500 milhões.

Na securitização, uma empresa transforma em valor mobiliário determinados ativos que não são mais líquidos e o lastro das suas cotas são recebíveis. Assim, empresas em situação de desvalorização patrimonial, e que não têm mais condições de tomar empréstimo, convertem esses ativos em um FIDC especial, que lança papéis no mercado para captar recursos para a compra da carteira de recebíveis da empresa. Já o FIP é o fundo pelo qual o investidor estrangeiro aloca capital na empresa brasileira tornando-se um acionista dela.

Os bancos vêm pressionando empresas a encontrar soluções para não ser prejudicados por sua inadimplência. Segundo o advogado Thiago Sandim, do Lefosse, é clara a pressão para que estas empresas firmem parcerias. Aquelas que optam pelo cross border, entram em contato com bancos de investimento que apresentam uma proposta de captação de recursos externos. “As empresas estrangeiras estão voltando a ter apetite por emissores brasileiros de valores mobiliários”, diz o advogado Roberto Vianna, também do Lefosse.

O banco estrutura a operação e a missão dos advogados é focada em fazer a auditoria da empresa, o prospecto para os investidores e a elaboração de documentos como o contrato de agente para facilitar as transações financeiras e o contrato com o banco de investimento, que vai fazer as ofertas dos valores mobiliários. Segundo Sandim, como o prospecto é fruto de grande parte dos conflitos judiciais que envolvem emissão de valores mobiliários, o documento deve sempre passar o maior número de informações, completas e atuais, para os investidores agirem conscientes. “Uma informação omitida pode levar a ações de indenização, ajuizadas por investidores, que, além de tudo, tramitarão em corte estrangeira, onde localiza-se o comprador”, diz.

A securitização é a operação cross border que mais se destaca no mercado porque a nova Lei de Falências garante que, em caso de falência da empresa cedente, não há contaminação do fundo. Além disso, empresas do setor público podem usar a ferramenta para captar recursos como fez a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). “Por causa da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), quando a empresa é do setor público, basta que fique claro que a operação é uma venda de ativos e não endividamento”, explica o advogado Enrico Jucá Bentivegna, do Pinheiro Neto.

As principais razões para um envolvimento limitado do investidor estrangeiro em relação a empresas brasileiras que optam pela securitização, segundo o advogado Tobias Stirnber, da banca Shearman & Sterling, são, entre outros, risco de falência da empresa, pouca padronização nas regras, ativos de difícil venda e a falta de benefício fiscal. Por isso, a isenção tributária é o que mais atrai os investidores estrangeiros ao FIP. No FIP, não incide IOF, nem imposto de renda sobre qualquer recurso que o cotista estrangeiro receba, se o fundo seguir alguns critérios. Segundo o tributarista do Pinheiro Neto, Ricardo Becker, são eles: os investidores não podem ter mais do que 40% das ações do fundo, o investidor não ter sede em paraíso fiscal, e o fundo não ter mais do que 5% de ações em fundo de dívida, exceto se for do governo. “Como no FIP, todos os acionistas devem participar das decisões estratégicas da empresa, conflitos entre controlador e minoritários são os mais comuns nessa modalidade.”, diz Enrico Bentivegna.

As operações cross border mais comuns, no Azevedo Sette, são financiamentos de longo prazo junto a organismos multilaterais, que são instituições internacionais das quais participam vários países como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e a Corporação Financeira Internacional (IFC, na sigla em inglês), que é um braço do Banco Mundial (Bird). Normalmente, os investimentos são vinculados a obras de infraestrutura como porto, estrada ou aeroporto, segundo o advogado Frederico Dieterich. “A retomada dessas operações é lenta, mas com operações significativas, de US$ 140 milhões e US$ 200 milhões”, contabiliza o advogado.

O pré-pagamento exportação, que consiste em o banco estrangeiro emprestar recursos para financiar a exportação de empresa brasileira, que depois paga o banco com dólares recebidos em futuras exportações também vem voltando a acontecer. “Sentimos a volta dessa operação com a melhora no pacote de garantias que hoje inclui bens e Cédula de Crédito Rural (CCR), entre outros”, diz o advogado do Pinheiro Neto, Bruno Balduccini. O escritório coordena quatro projetos de US$ 100 milhões relacionados aos ramos de usinas de açúcar e álcool no nordeste do país.

Matéria publicada no jornal Valor Econômico, no caderno Legislação & Tributos