Quais os entraves para uma fábrica de semicondutores no Brasil?


Quais os entraves para uma fábrica de semicondutores no Brasil?


São Paulo – Carga tributária, logística e processo aduaneiro não adequado afugentam investimentos de uma indústria de semicondutores no Brasil.

O Brasil negocia uma fábrica de semicondutores com europeus e japoneses como uma das contrapartidas na escolha do padrão do padrão de TV digital.

Por que, até agora, o governo recebeu apenas promessas de estudos de viabilidade econômica para uma fábrica de semicondutores, item considerado vital para a indústria eletroeletrônica?

A resposta está em um estudo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), realizado pela consultoria de tecnologia IDC, a AT Kearney e a Azevedo Sette Advogados.

Este estudo, entregue aos executivos do banco no final de 2002, apontava uma série de entraves e de desafios que precisavam ser vencidos pelo governo brasileiro para pleitear a sua aceitação no clube dos países com fábricas de semicondutores.

“É viável ter uma fábrica de semicondutores no Brasil, mas é desafiador”, diz Mauro Peres, diretor de consultoria do IDC Brasil, que participou do estudo. “Temos concorrentes muito fortes, como Taiwan, Coréia e Japão, com políticas de incentivos fiscais agressivas.”

Por políticas fiscais agressivas entenda-se uma série de incentivos ligados a redução de impostos (territorial e comercial), doações de terrenos, além de que alguns países participam do investimento, com aporte de recursos.
O estudo apontava cinco itens considerados críticos para que uma empresa de semicondutores se instalasse no Brasil:

1) Disponibilidade de mão-de-obra especializada: era considerado um dos itens mais importantes, segundo a própria indústria de semicondutores, que foi entrevistada para o estudo. Em notas de 1 a 5 (sendo 5 a mais importante), o Brasil estava no estágio 2, pois o país tem poucos doutores nesta área e a maioria trabalha no exterior.

2) Demanda local elevada: nenhuma fábrica de semicondutores é construída pensando somente na demanda local, mas ela é um fator importante no processo de decisão. A demanda brasileira ainda é muita baixa comparada com os principais competidores, que são Irlanda, Alemanha e os paises asiáticos.

3) Proteção ao capital intelectual e lei de patentes: muito se evolui de 2002 até hoje, mas ainda, na visão do diretor da IDC, este é um ponto crítico, principalmente em projetos de design de semicondutores.

4) Disponibilidade e confiabilidade da infra-estrutura: inclui de porto a aeroportos à infra-estrutura de escoamentos dos produtos, como as estradas.

5) Eficiência da estrutura de importação e de exportação: é a capacidade de liberar rapidamente os produtos. “Todo ano, há pelo menos duas greves da Receita Federal”, diz Peres.

Fábrica

Há três tipos de “indústria” de semicondutores. A primeira delas é ligada ao design, cujo capital é apenas intelectual: engenheiros, altamente especializados, que criam os projetos de chips, para que depois sejam manufaturados.

O segundo processo é chamado na indústria de back-end, que é a fabricação propriamente dita. A matéria-prima para a fabricação são cilindros de silício cristalino com um índice de pureza de 99,9999%. Estes cilindros são cortados em discos muito finos, os chamados wafers (bolachas), onde serão formados os circuitos. Este é a parte mais cara – as fábricas podem chegar a custar bilhões de dólares – mas cujo processo é quase todo automatizado, gerando pouco empregos.

A terceira parte é o encapsulamento e os testes, chamados de front-end pela indústria. Consiste na separação dos circuitos integrados individuais no wafer e na colocação dos mesmos em cápsulas. Com isso, ele fica pronto para ser utilizado em placas de circuito de qualquer equipamento eletroeletrônico.

“A indústria de semicondutores não é intensiva em geração de empregos”, afirma Mário Peres. “Mas o seu ecossistema, sim”.
O ecossistema do setor de semicondutores consiste em indústrias químicas, que fornecem a matéria-prima para a transformação do silício, principal item para a produção dos wafers.

Déficit

Por que o governo insiste em uma fábrica de semicondutores? É só observar os dados de importação.

Em 2005, segundo a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), as importações do setor totalizaram 15 bilhões de dólares, crescimento de 20% sobre o ano anterior. E os componentes tiveram 65% de participação deste valor.

“É uma oportunidade para que a gente passe a ter aquilo que não conseguiu nas últimas décadas e que outros países conseguiram: a indústria nessa área importantíssima de componentes eletrônicos”, afirmou Júlio Gomes de Almeida, diretor-executivo do Instituto de Estudos sobre o Desenvolvimento Industrial, para a Agência Brasil.

Até agora, o Brasil tem recebido promessas vagas sobre uma fábrica de semicondutores. Os europeus, por exemplo, disseram que precisam de um ano para fazer um estudo de viabilidade econômica.

A ST Microelectronics e a Philips, segundo os europeus, têm intenção de se instalar no Brasil, segundo a proposta apresentado ao governo brasileiro.

Os japoneses, que também participam da disputa pelo padrão de TV digital, negociam com o governo brasileiro a instalação de fábrica para produzir semicondutores.

Publicada em 27 de março de 2006 no: IDG Now e Revista Computer World