STJ manda Justiça do Rio julgar relacionamento gay


STJ manda Justiça do Rio julgar relacionamento gay


Processo em que dois homens buscam ter união reconhecida estava arquivado. Pela primeira vez, tema é tratado como direito de família

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou hoje à Justiça do Rio de Janeiro que decida se um casal homossexual vive ou não uma união estável, formando uma família. Essa foi a primeira vez que o tribunal analisou uma ação movida por um casal homossexual sob o ângulo do direito de família.

O juiz da Vara da Família de São Gonçalo e, posteriormente, o Tribunal de Justiça do Rio tinham se recusado a analisar a ação proposta por um agrônomo brasileiro e um professor canadense que se relacionam há 20 anos e são casados oficialmente no Canadá. Para arquivar o processo, a Justiça tinha argumentado que o pedido era impossível porque, no Brasil, apenas a união estável de casais formados por homem e mulher é reconhecida.

A decisão foi tomada hoje na quarta turma do STJ por 3 votos a 2. A ala majoritária não chegou a concluir expressamente que o casal vive uma união estável. Mas, ao mandar a Justiça do Rio analisar o processo, os ministros sinalizaram que, no futuro, pode ser reconhecida a validade de uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo.

O julgamento foi iniciado no ano passado, adiado algumas vezes por pedidos de vista. Ao ser retomado hoje, estava empatado em dois votos a dois. O desempate coube ao ministro Luís Felipe Salomão, que disse não haver impedimentos jurídicos para que o juiz da Vara de Família decidisse o caso. De acordo com ele, o juiz somente poderia se recusar a julgar a ação se houvesse uma proibição legal expressa ao prosseguimento de ações em que é pedido o reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo.

  • Discussão

O advogado do casal, Eduardo Coluccini Cordeiro, afirmou que a decisão do STJ é importante porque determina ao juiz da Vara de Família de São Gonçalo que julgue a ação movida pelo casal. “Os votos dos três ministros (favoráveis ao julgamento da ação) abrem caminho para que a discussão seja aprofundada”, avalia o advogado. Ele observou que os juízes de primeira instância não poderão mais se esquivar de decidir casos semelhantes.

Para a advogada especializada em direitos de homossexuais, Sylvia Maria Mendonça do Amaral, a decisão representa um avanço. “Agora, a tendência é que grande parte de pedidos semelhantes sejam analisados sob a ótica do direito de família, já que o STJ o fez”, diz.

Eduardo Cordeiro explica que seus clientes se casaram oficialmente no Canadá, onde é permitido o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Se conseguirem o reconhecimento da união estável no Brasil, eles poderão requerer uma série de benefícios, como um visto permanente para o canadense, além de direitos de herança, previdenciários e, eventualmente, de adoção de crianças.

Notícia publicada no Correio Braziliense, 03 de setembro de 2008