Telecoms Series | As Incertezas na Regulamentação do Compartilhamento de Postes


Telecoms Series | As Incertezas na Regulamentação do Compartilhamento de Postes


As indefinições relativas à questão do compartilhamento de postes entre concessionárias de energia elétrica e prestadoras de serviços de telecomunicações prosseguem e poderá ser necessário ainda algum tempo até que as partes envolvidas cheguem a um consenso final sobre o assunto.

Inicialmente, é importante ressaltar que a Lei Nº 9.472, de 16 de julho de 1997 (Lei Geral de Telecomunicações, “LGT”), versa sobre o assunto ao dispor que as prestadoras de serviços de telecomunicações de interesse coletivo (sendo tais serviços entendidos como aqueles cuja prestação deve ser proporcionada pelas operadoras a qualquer interessado na sua fruição, em condições não discriminatórias, com o cumprimento dos termos regulamentares aplicáveis) têm assegurado seu “direito à utilização de postes, dutos, condutos e servidões pertencentes ou controlados por prestadora de serviços de telecomunicações ou de outros serviços de interesse público, de forma não discriminatória e a preços e condições justos e razoáveis”. O texto da LGT esclarece ainda que as condições para o cumprimento de tal ordenamento devem ser definidas pelo órgão regulador do cessionário das referidas estruturas.

Em junho do corrente ano, foi publicado o Decreto nº 12.068/2024 que, ao versar sobre a licitação e a prorrogação das concessões de distribuição de energia elétrica, estipulou também diretrizes para a modernização das referidas concessões, sendo imposta a cessão onerosa da exploração de postes como uma obrigatoriedade. 

A redação do Decreto nº 12.068/2024 estabelece que as “concessionárias de distribuição de energia elétrica deverão ceder a pessoa jurídica distinta o espaço em infraestrutura de distribuição, as faixas de ocupação e os pontos de fixação dos postes das redes aéreas de distribuição destinados ao compartilhamento com o setor de telecomunicações”. 

Com isso, ocorreu a criação da figura que tem sido denominada “posteiro”, ou seja, uma empresa terceira, não vinculada às distribuidoras de energia ou às operadoras de telecomunicações, que administrará o compartilhamento dos postes, procedendo à fiscalização do seu uso e à correlata cobrança.

O Decreto supra mencionado também determinou que o compartilhamento destas estruturas deve ser objeto de regulação conjunta da Agência Nacional de Telecomunicações (“ANATEL”) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (“ANEEL”). 

No que se refere às providências de incumbência da ANATEL sobre a regulação, é relevante mencionar que no ano de 2023 a Agência reguladora já havia aprovado a minuta de uma nova resolução conjunta. Além disso, após diversas discussões havidas entre as entidades reguladoras dos setores elétrico e de telecomunicações anteriormente citadas, a minuta de um novo regulamento aplicável ao compartilhamento de estruturas encontrava-se sob a análise da ANEEL. 

Contudo, em julho do corrente ano, a ANEEL decidiu extinguir, sem decisão do mérito, o processo que daria origem a um novo regulamento de sua parte, sob a alegação de que o Decreto Nº 12.068/2024 trazia um fato novo, tal seja, a obrigatoriedade de compartilhamento de espaços de infraestruturas presentes nos postes. Esta agência se insurgiu contra tal obrigatoriedade e, adicionalmente, fez referência o encerramento do mandato do então Relator do respectivo processo como um segundo motivo para decidir pela sua extinção.

Como a concordância de ambas as agências reguladoras ANEEL e ANATEL é necessária para a aprovação de um regulamento, passou a existir um impasse a ser superado.

A importância do assunto foi enfatizada pela Federação Nacional das Empresas de Infraestrutura de Rede de Telecomunicações (“Feninfra”), que apresentou junto à ANEEL um pedido de reconsideração da extinção do processo, no qual a entidade pretendeu ver também assegurada a corresponsabilidade das empresas dos setores de energia e telecomunicações no que se refere aos custos de limpeza e reordenamento dos postes. 

Regulamentar o compartilhamento é, de fato, um assunto relevante. De acordo com a Feninfra, a ocupação irregular dos postes é “insustentável”, ocasionando riscos à prestação de serviços de telecomunicações, à segurança da população e aos trabalhadores com acesso às redes; ademais, foi mencionado que a falta de gestão dos postes está relacionada ao aumento dos furtos de cabos e equipamentos. 

Por sua vez, a ANEEL ressaltou que o acesso aos postes é proporcionado mediante valores que necessitam ser revistos, de maneira a haver uma simetria econômica entre as partes envolvidas. Neste sentido, vale aqui citar que a ANATEL conduz estudos relativos aos custos reais para o compartilhamento da infraestrutura. 

Posteriormente à extinção do processo no âmbito da ANEEL, mais precisamente em agosto deste ano, um representante desta agência reguladora manifestou que os debates poderiam ser retomados em curto prazo, inclusive sem a necessidade de uma negociação totalmente nova. Isto seria possível por meio do resgate do processo, ou de sua reanálise a partir do pedido da Feninfra. E, de fato, no final do mesmo mês, o processo de análise da resolução conjunta foi reaberto pela ANEEL, com a designação de um novo Relator.

No que se refere à atuação da ANATEL sobre o tema, diversos meses após a supramencionada tomada de decisão havida em 2023, em agosto último foi publicado o acórdão por meio do qual a Agência aprovou sua proposta para um novo regulamento, em que defende que a cessão dos espaços de infraestrutura em postes seja obrigatória, ou seja, em dissonância com o que pretende a ANEEL. Contudo, o acórdão não tem efeitos práticos, uma vez que, como salientado, a análise da ANEEL também se faz necessária.

Os serviços de telecomunicações e a adequabilidade de sua prestação dependem, em grande parte, do compartilhamento dos postes, em especial ao se considerar que a demanda por acesso à conectividade tende a aumentar cada vez mais. Assim sendo, o novo regulamento conjunto deverá tratar de questões práticas como o reordenamento da ocupação dos postes, a correção de instalações irregulares, quais partes devem assumir os custos correlatos, bem como o preço regulado a ser cobrado pela utilização da infraestrutura e a respectiva metodologia de cálculo; portanto, torna-se importante acompanhar os futuros desenvolvimentos do tema.

Para receber as principais notícias e posicionamentos legislativos sobre este e outros temas relacionados a telecomunicações, acompanhe a equipe de Tecnologia, Mídia e Telecomunicações (TMT) do Azevedo Sette Advogados.